Dinheiro, IF e FIRE

Prefira estar errado no curto prazo, mas certo no longo prazo

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Para algumas pessoas, eu sempre estive errada.

Errada por morar de aluguel, errada por não ter um carro durante tantos anos mesmo com o nascimento das minhas filhas, errada pelas minhas filhas estudarem em uma creche pública, errada por economizar boa parte do meu salário, errada por querer me planejar e pensar em algo que ainda iria demorar para acontecer.

A diferença é que eu sempre soube que estava certa, e eu sempre tive o meu marido que confiou em mim.

Antes mesmo de conhecer o conceito FIRE (Financial Independence Retire Early), eu e ele já vivíamos de modo diferente da maioria, nós éramos frugais. Nós não importávamos com o que os outros falavam de nós, porque tínhamos um ao outro.

Quando eu comprei meu primeiro imóvel próprio, caindo aos pedaços, muitas pessoas falaram que eu estava fazendo a maior besteira da minha vida, mas eu enxergava potencial. Era um imóvel muito bem localizado, onde os dois quintais (de uma cobertura) estavam na justiça. Comprei assim mesmo, porque avaliei que só a parte de dentro do apartamento, sem os quintais, valia o que estava sendo cobrado. Contratei um bom advogado e deixei rolar. Enquanto isso, fiz uma reforma básica para morar bem e depois de alguns anos, vendi com muita facilidade. Ah, ganhei a causa dos quintais.

Quando coloquei minhas filhas na creche municipal, ouvi uns comentários maldosos sobre esse assunto. Mas o que ninguém sabia era a nossa motivação, o objetivo principal de colocarmos as meninas em uma escola pública. Talvez para quem já veio de uma família de classe média e alta, e sempre estudou em uma escola privada, colocar os próprios filhos numa escola pública seja o fim do mundo. Mas para mim e para o meu marido que estudou a vida inteira em escola pública, nós tínhamos outras motivações, que não eram apenas financeiras.

Quando descobri sobre FIRE e comecei a falar para os amigos e colegas próximos, algumas pessoas riram na minha cara e a maioria das pessoas nem quiseram ouvir o que eu tinha para falar. Comportamento bem diferente do meu marido, que desde o primeiro momento em que sentei do seu lado para explicar sobre o conceito FIRE, ele não só acreditou em mim, como entrou no mesmo barco e começamos a remar juntos. Passados 6 anos, nossa vida deu uma reviravolta (apesar de ninguém perceber essa diferença, porque quase não aumentamos nosso padrão de vida), não há se quer 1 único dia que eu não agradeça por ter tomado essa decisão lá atrás.

Quando as crianças nasceram, decidimos interromper temporariamente as viagens para o exterior, pois queríamos aumentar os aportes e também porque sabíamos que fazer um tour por um país desconhecido com 2 bebês que usavam fraldas não seria uma tarefa das mais fáceis. Sabíamos também que teríamos uma janela de tempo para poupar, pois conforme as crianças crescem, os gastos tendem a aumentar.

Eu e meu marido sempre vivemos abaixo do padrão que poderíamos viver. Então enquanto todos tinham carro, eu andava de ônibus e metrô, o marido de bicicleta. Enquanto todos compravam uma casa, eu continuava no meu apartamento alugado. Quando os amigos começaram a reformar seus imóveis, lá estava eu morando de aluguel ainda. Quando vieram os filhos e todos colocaram em creche particular, eu coloquei na creche municipal do bairro.

Essas são algumas das coisas que as pessoas viram. O que ninguém viu, é que eu não vivi na frugalidade à toa. Eu investi toda essa diferença não-gasta.

Eu poupei todo o dinheiro por não ter um carro. Também poupei todo dinheiro da reforma de um apartamento que não comprei. Poupei todas as vezes que não saí comprando algo desnecessário.

Minha mãe trabalhava para algumas pessoas que tinham um poder aquisitivo elevado. E ela viu muitas destas pessoas quebrarem. Veja que eram pessoas milionárias, que eram donas de empresas, tinham negócios que envolvia toda a família.

Ela sempre falou que não era feio ser pobre (como nós éramos). Feio, era esbanjar dinheiro e no futuro ser pobre, porque isso significava que você geriu mal o seu dinheiro.

Foi com essa frase que eu comecei a minha vida, lá de baixo. Eu entendi que eu poderia aumentar meu padrão de vida se eu tivesse condições de mantê-lo, ou seja, deveria ser uma escolha consciente, e vir de forma constante e devagar.

E é justamente por isso que nesses 11 anos que eu e marido estamos juntos, nunca recuamos nosso padrão de vida, porque crescemos muito mais devagar do que os outros.

Já morei em diversos tipos de apartamento, e em todos eles, vou melhorando um pouquinho. Comecei morando em uma república na época da faculdade, depois dividi quarto com uma amiga, depois morei nos fundos de uma casa de uma família, para finalmente conseguir morar sozinha.

A mesma coisa acontece com a escolha dos bairros. Comecei morando em uma rua encostada em uma favela, porque era o único lugar que eu conseguia pagar com o meu salário que era muito baixo. Depois fui morar em um outro bairro mais simples, e aos poucos fui melhorando, até conseguir morar em um bairro que eu sempre quis morar.

Hoje compro móveis e eletrodomésticos novos, mas cansei de comprar itens usados, de segunda mão, com preços extremamente acessíveis. Já comprei mesa, geladeira, fogão usado, porque nunca foi vergonhoso, eu sempre soube que era uma fase da vida.

Há um exemplo que eu gosto muito de dar, porque exemplifica muito bem o poder do tempo e dos juros compostos que a gente costuma negligenciar.

Imagine uma pessoa começando a investir aos 20, e continua fazendo aportes todos os meses no valor de R$1.000 (vamos desconsiderar a inflação, ok?) até os seus 40 anos, a um retorno hipotético de 10% ao ano. E dos 40 até os 60 anos, não faz absolutamente nada, não coloca mais nenhum dinheiro, só deixa rendendo. Ou seja, investiu por 20 anos, e deixou o dinheiro rendendo por mais 20 anos.

Enquanto a segunda pessoa investiu os mesmos 20 anos do que a pessoa do primeiro exemplo, mas ao invés de começar aos 20 anos de idade, decidiu começar ao 40 e foi até os 60 anos.

Os dois têm 60 anos hoje. Adivinhem quanto cada um tem?

A primeira pessoa tem R$ 4.877.348,19

A segunda pessoa tem R$ 724.986,73

Uma diferença de mais de 4 milhões de reais, sendo que o valor poupado foi exatamente o mesmo. A vantagem está no tempo, para quem começou a investir mais cedo. E é aí que está o grande segredo. Poupar no início da vida financeira para que os juros compostos tenham tempo para crescer. Agora imagine se esse valor inicial investido não fosse de R$1.000, fosse mais?

Os valores impressionam.

O que eu quero dizer aqui é que sempre é tempo de começar, alguns podem dizer, ah, pra mim é tarde demais, mas a verdade é que nunca é tarde. Claro que quanto mais cedo começar, melhor, mas se isso não foi possível, por qualquer que seja o motivo, é importante começar hoje.

~ Yuka ~

26 comentários em “Prefira estar errado no curto prazo, mas certo no longo prazo

  1. Yuka,

    Viver abaixo do padrão não deveria ser visto como algo negativo como nossa sociedade vê. Muito pelo contrário, pois isso pode significar um consumo mais consciente de bens e serviços. E se pensarmos que somos criaturas de hábitos, a simplicidade acaba fazendo mais sentido ainda.

    Uma vida mais simples hoje pode significar uma certa tranquilidade financeira amanhã. Cabe à cada um de nós escolher qual caminho seguir.

    Boa semana!

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  2. Oi
    Você já pensou em fazer podcast ou editar um livro?
    Você tem bagagem para isso.
    Pensa a respeito.
    Você iria ajudar muitas pessoas pensarem fora da casinha.

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    1. Oi Luciana, podcast acho que não sirvo, menina, sou uma mulher sucinta demais rsrs, se eu fizer um podcast, consigo falar tudo o que eu quero de forma resumida em 5 minutos rsrsrs. Mas publicar livro é algo que já pensei, é um projeto que ainda está em segundo plano, mas confesso que é algo que um dia gostaria de fazer sim rs. Um beijo!

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      1. Oi Sérgio, isso mesmo, durante todo esse tempo, você terá feito o seu trabalho (de trabalhar e investir dinheiro), e o dinheiro fará o trabalho dele (de multiplicar seu capital). Muitas pessoas querem enriquecer de um dia para o outro, e não entendem que isso é impossível (salvo raras exceções, claro). Enriquecer é exatamente isso que você está fazendo, mês após mês, aportar parte do salário em bons investimentos. Um beijo.

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  3. Bom dia,
    Mais um excelente texto. Eu sou funcionária publica afastada sem remuneração.
    Quando cometei o que ia fazer em 2019 as pessoas ao meu redor disseram que era louca por largar meu salario para e aventurar “sem dinheiro”, já que não temos FGTS.
    Porém, já tinha um grana guardada e resolvi tentar construir um nova profissão em outra região. Assim o fiz, estou ganhando menos da metade do que ganhava mas ganhando experiência profissional e pessoal que a longo prazo vão me levar MUITO mas longe do que se tivesse ficado na minha zona d conforto.

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    1. Parabéns Marcela.
      Não sei sua idade, se tem filhos etc, já que essas questões também influem em decisões do tipo que você tomou.
      Mas independente disso, gosto de relatos como o seu, sou funcionário público de área administrativa (o trabalho de escritório) e sei como esse tipo de ambiente pode se tornar desestimulante com o passar do tempo. Tem muito funcionário acomodado, trabalhando de má vontade, fazendo corpo mole e por consequência atrapalhando os outros funcionários e desestimulando desde cedo os funcionários novos que entram no serviço.
      Claro que não são todos assim, mas não são tão poucos também. E dificilmente algum servidor pede exoneração para tentar algo novo, mesmo que esteja descontente no emprego.
      A maioria está pendurada em empréstimos consignados o que também faz com que essas pessoas se mantenham presas a seus empregos, num ciclo que em muitos casos termina só na aposentadoria.
      Para o servidor é fundamental fazer uma reserva financeira, só assim para tomar atitudes como você tomou.

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      1. Obrigado! Tenho 34 anos e não tenho filhos. Durante meu tempo no funcionalismo vi muito do que você descreveu. Como sou do baixo clero do funcionalismo , rsrsr, levei alguns anos juntando dinheiro para esse fim. E digo que não me arrependo. Penso que se der errado volto amadurecida.

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      2. Oi Anon, é exatamente isso que acontece, as pessoas novas entram, olham as pessoas acomodadas, trabalham o dobro (aquela velha frase, embaixo de um folgado sempre tem um sobrecarregado), mas sempre tem um discurso lindo para justificar suas atitudes. Isso cansa. E aí os que trabalhavam, ficam desestimulados, vão desistindo, e vai virando um círculo vicioso… É trágico, revoltante e triste. Beijos.

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        1. Sim Yuka, esse ciclo vicioso existe, quem trabalha a alguns anos nesses ambientes fatalmente vai identificar o que eu falei.
          Você percebe que os erros, falhas, atrasos etc que acontecem nesses locais são causados pelos mesmos motivos, vícios de trabalho que parte dos servidores tem e dois quais não querem abrir mão de jeito nenhum.
          Isso quando os mais experientes no trabalho não boicotam o trabalho dos mais jovens que querem de fato fazer alguma coisa.
          Falta comunicação clara entre as pessoas também. Mas a comunicação é bem clara para fofocas e intrigas sobre a vida alheia.

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          1. Fora a resistência gigantesca em mudar algum processo de trabalho, rever procedimento, ter a humildade de reconhecer que o novo pode ser bom…. é algo desgastante. Já vi muitos servidores bons saindo do funcionalismo público, porque simplesmente não aguentaram esses vícios de trabalho. Uma pena… Beijos.

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    2. Oi Marcela, olha aí, mais uma pessoa que me entende quando somos chamadas de loucas rsrs. Seu caso exemplifica bem o que escrevi no post de hoje… Para os olhos das pessoas, você está errada neste curto espaço de tempo, mas você sabe que está certa a longo prazo. As pessoas não enxergam o seu planejamento de longo prazo, e julgam pelas suas decisões a curto prazo. Acho que nunca te perguntei, qual área profissional você está desbravando? Beijos.

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  4. Boa noite Yuka! Acho que o melhor investimento que fiz (e olha que foi na sorte) foi ter encontrado uma parceira que tivesse os mesmos valores e uma cabeça boa em relação ao que é realmente importante na vida. Sem um companheiro (a) que também tenha interesse pela filosofia FIRE o caminho será impossível de ser seguido. Concordo 100% com o que você disse…quem sabe se uma decisão é certa ou não é você (e companheiro)…Nesse caminho diversos amigos virão apontar como estamos fazendo errado e até insinuar que somos “financiadas” mas não conseguem ver a médio/longo prazo. Só quem entende o poder dos juros compostos entende o quanto é benefício economizar e investir o quanto antes, sem também sacrificar a qualidade de vida.
    Grande abraço!
    VVI – vvibr.blogspot.com

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    1. Oi VVI, também sou da mesma opinião que você, eu só consegui suportar todas as desconfianças e em algumas vezes, uma certa chacota, porque tinha uma pessoa que acreditava 100% em mim, e sabia que eu não estava louca, nem sendo ingênua, que o plano FIRE seria possível. Meu marido é físico, então tudo ficou claro quando ele viu o gráfico dos juros compostos…. é puramente matemática rsrs. Beijos.

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  5. Eu tenho sempre enviado seus textos a minha esposa, porque enxergo que somente um contando com o outro que podemos realizar coisas do tipo. Seus textos são sempre muito inspiradores, Yuka, deu um baita animo enquanto eu lia.

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  6. Eu agradeço toda semana pode ler o que você compartilha conosco, Yuka! Gostaria de ter lido isso há 15 anos atrás, mas talvez não tivesse maturidade para entender. E mesmo vivendo um padrão de vida elevado, consegui juntar dinheiro quando me dispus a pedir licença sem remuneração para fazer outra graduação. Imagina se eu tivesse sido a pessoa que juntou dos 20 aos 40?
    Uma coisa que gosto bastante dos seus textos é o otimismo, obrigada por terminar sempre lembrando que é tempo de começar.
    Sobre estar errada, é incrível sua inteligência emocional em lidar com tudo isso. Realmente, você é uma mulher inteligente em diversos aspectos! Qualquer pessoa que sobressaia do comum é alvo de críticas, mas lidar bem com essas é para poucos.
    Bjs
    P.s mandei a parte dos valores para uma grande amiga e ela tá chocada.

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    1. Oi Diana, eu também não teria maturidade para entender, caso alguém tivesse falado para mim algo deste tipo há 15 anos rsrs. Por isso que digo que o melhor dia sempre é o dia de hoje, pois é quando tomamos consciência e estamos prontos para mudar algo que incomoda na nossa vida, por isso digo que é sempre tempo de recomeçar. Um beijo!

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  7. Olá, sempre leio seus textos e me identifiquei muito com esse rsrs. Aos olhos dos outros, meu marido e eu tb somos errados, mas não nos sentimos assim….Fomos mudando de bairro por causa de engarrafamento que afetava nossa qualidade de vida e procuramos algo que coubesse “folgado” no nosso orçamento para usufruir de mais grana pra investir e conseguimos. Vivemos tb abaixo do nosso padrão, mas nem por isso deixamos as pequenas alegrias de estarmos juntos. Meu filho tb estuda em escola pública ótima aqui em BSB e ela é em período integral e ele gosta muito tanto das atividades lúdicas quanto as tarefas de classe msm. Não precisa ter muito. É só alinhar sua renda ao consumo consciente. E concordo plenamente com sua mãe.
    Parabéns novamente pela inspiração.

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    1. Oi Lucia, tudo bem? Quando somos um pouco diferentes, um pouco fora do padrão, algumas pessoas podem achar erroneamente que estamos errados. Daí a importância de entender o motivo das nossas decisões. Eu não fico argumentando com as pessoas que não concordam comigo, principalmente porque a vida é minha e eu não devo explicações para as outras pessoas, mas internamente, tenho respostas para tudo e ainda me acho muito esperta rsrsrs. Tenho certeza que com você e seu marido deve acontecer a mesma coisa, porque vocês sabem o motivo de ter mudado de bairro, o motivo do seu filho estudar em uma boa escola pública, etc. Um beijo!

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